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Frases Célebres

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Verdade e Religião


Venho afirmando constantemente que sou um perseguidor da verdade e, certamente, alguém com essa característica tem que ter uma opinião formada sobre a religião. Eu tenho e não me furtaria a expressá-la.
Entendo que nesse campo devemos partir de uma verdade genérica: o sentimento religioso é inerente à espécie. Essa é a única coisa cientificamente comprovada sobre o tema. A arqueologia já demonstrou que os mais remotos resquícios da existência do homem no planeta possuem vestígios de um sentimento religioso presente e atuante. Aparentemente, a idéia de Deus já nasceu com o homem, e sempre integrou seu patrimônio cultural, ligada aos questionamentos ontológicos e à busca de respostas para as preocupações de caráter finalístico: quem sou eu? De onde vim? Por que estou aqui? Para onde vou?
Apesar disso, a ciência positiva jamais se interessou em pesquisar o tema, até mesmo em função da absoluta impossibilidade de se produzir uma investigação palpável criteriosa, em face da abstração absoluta do objeto de pesquisa. Como investigar Deus? Por onde começar? Que metodologia utilizar?
Diante dessas dificuldades, a religião sempre foi e ainda é matéria ligada exclusivamente à fé, o que implica em acreditar sem exigir provas concretas, pois que essas não existem, nem mesmo nas religiões mais fenomênicas, uma vez que os fenômenos acontecem numa esfera estritamente pessoal e sempre podem ser produzidos pela própria mente, através da indução.
É possível afirmar, então, que, do ponto de vista prático, não existe uma verdade religiosa absoluta, visto que, sendo artigo de fé, a verdade religiosa está situada no campo da verdade de cada um, enveredando, portanto, pela senda das subjetividades, das idiossincrasias e dos interesses; notórios inimigos do conhecimento objetivo.
Como, então, conciliar a religião e a verdade?
A meu ver, existem duas maneiras de fazer isso: uma é investigar o critério utilizado por cada um na construção de sua própria verdade, o que equivaleria a perguntar às pessoas em que elas acreditam e que razões as levam a acreditar naquilo, procurando aferir, a partir das respostas obtidas, o grau de racionalidade envolvido na escolha.
Esse meio, contudo, além de bastante penoso, acabaria por se mostrar muito improdutivo, pois é quase certo que a maioria não saberia dar as respostas, principalmente em relação às razões de acreditar.
Resta então uma segunda maneira que consiste em investigar as doutrinas religiosas existentes, buscando aferir o grau de coerência interna, isto é, a integração entre os múltiplos conceitos existentes, além do grau de adequação entre as explicações e os fatos observáveis. Esse procedimento pode nos demonstrar muito claramente o nível de sustentabilidade de uma doutrina e, por consequência, nos instruir quanto ao índice de racionalidade empregado por seus fiéis na escolha de suas crenças.
É preciso, inicialmente, considerar que toda doutrina religiosa é, na verdade, um sistema filosófico que envolve concepções cosmogônicas, conceitos teológicas e ontológicas, uma ética bem definida e, até mesmo conceitos estéticos, não podendo jamais se afastar de pressupostos lógicos, sob pena de produzir a internegação de seus conceitos e valores, bem como de se afastar dos limites do verossímil.
Sinteticamente podemos dizer que qualquer religião procura conceituar e explicar Deus, conceituar e explicar o homem e o mundo, estabelecendo leis que rejam de forma harmônica a relação Deus-homem-mundo. Com base nisso é possível nortear uma metodologia de análise que nos leve a resultados bastante razoáveis, senão, vejamos:
Pouco ou nada sabemos sobre Deus e não dispomos de meios eficazes para aumentar esse conhecimento, mas conhecemos o homem e conhecemos o mundo. Considerando, aliás, o nível de evolução da ciência, eu arriscaria a dizer que temos um conhecimento bastante substancial sobre ambos. Ora isso nos deixa, então, com uma equação com apenas uma incógnita, cujo resultado talvez não nos permita afirmar com certeza o que é verossímil, mas certamente nos permitirá negar peremptoriamente o que é absurdo. E o que é absurdo? Obviamente o que é contrário à lógica pois tende a quebrar a harmonia do sistema, e uma coisa que só se estrutura na harmonia que é capaz de produzir e que tem essa harmonia quebrada por seus próprios elementos internos, nega-se a si mesma.
Exemplificando: se uma doutrina religiosa conceitua Deus como um ser infinitamente justo, misericordioso e bom; e, ao lado disso, preconiza esse mesmo Deus preservando um suposto inferno, lugar destinado àqueles que ele mesmo condenará a penas e provações eternas, essa doutrina não possui coerência interna, pois o fato de preservar um lugar unicamente destinado à dor contradiz a infinitude de sua bondade; o fato de condenar por erros efêmeros a penas eternas contradiz a infinitude de sua justiça e o fato de condenar ao invés de perdoar contradiz a infinitude de sua misericórdia.
Ainda exemplificando, se mesmo diante do generoso acervo de evidências científicas devidamente comprovadas dos diversos estágios evolutivos do planeta e do homem, uma doutrina religiosa insiste em preservar um mito criacionista, essa doutrina não possui adequação entre suas teorias e os fatos observáveis.
Não pretendo esgotar o assunto nessas poucas linhas, mas creio já haver falado o suficiente para fundamentar minha opinião sobre o assunto: a convergência entre religião e verdade está diretamente ligada à capacidade de empregar de forma clara e objetiva a razão no julgamento das concepções doutrinárias que nos propomos a abraçar.

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