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Frases Célebres

terça-feira, 23 de março de 2010

Ecologia e Discurso Vazio



Após a Primeira Revolução Industrial (final do Séc. XVIII) o mundo começou a assistir a um gradativo processo de expansão do capitalismo, lastreado nos novos meios de produção. A máquina potencializou a capacidade de produzir bens de consumo e possibilitou uma aceleração nos lucros, até então inimaginável.
A partir do início do Séc. XX, essa tendência se acentuou e a busca de novos mercados acabou por levar a um grande conflito mundial, de onde, inclusive, emergiu o primeiro país socialista do mundo. Isso criou um novo estímulo ao capitalismo que, agora, precisava provar sua supremacia, para continuar a existir.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, as novas tecnologias e o aporte de conhecimentos adquiridos elevaram a capacidade de produção a níveis quase inacreditáveis e o capitalismo ganhou características predatórias. Rapidamente caminhamos para um mundo completamente subjugado pela ideologia do ter e do acumular.
Acontece que produzir exige o uso de recursos naturais, a transformação desses recursos produz gases carbônicos e lixo, e não existe alternativa a esse fato. Em todos os setores da produção, o ciclo de transformação demanda uma interferência na natureza. Isso é inexorável. Então, a pergunta seria: há como mitigar os efeitos danosos dessa interferência?
Sem dúvida há. Porém, essa atenuação demanda custos muito mais elevados de produção e, em certos casos, pode implicar até mesmo numa significativa diminuição dessa mesma produção. Acontece que a lógica do capitalismo predatório é produzir muito, a custo baixo. É mais do que óbvio que os grandes investidores não estão absolutamente preocupados com a preservação da natureza e o bem estar do planeta, até porque, em sua lógica, quando as previsões funestas de um planeta inabitável se concretizarem, eles já não estarão mais aqui para viver esses horrores. E aí, mais vale desfrutar de um bem estar presente, que preservar um mundo para as gerações futuras.
O petróleo e sua multiplicidade de utilizações foi outro fator a contribuir para um desenvolvimento desordenado com um custo elevado para a natureza. Dos escapamentos de nossos veículos, até as sacolinhas de plástico dos supermercados (recentemente transformadas em grandes vilãs), tudo polui, tudo causa dano ambiental, mas a multibilionária indústria petrolífera continua a crescer, alheia a tudo isso, e nós continuamos a consumir derivados de petróleo, porque, afinal, todo mundo quer preservar a natureza, mas ninguém quer abrir mão de suas comodidades diárias. E sejamos honestos: dá para imaginar um mundo sem plástico? Ora, grande parte dos utensílios que hoje são feitos em plástico, até algum tempo atrás eram feitos em madeira. Cortar árvores também não destrói a natureza?
Antes que pensem que eu sou um inimigo da ecologia, devo esclarecer que, mais do que muitos que se autointitulam defensores da natureza, eu reconheço e entendo a necessidade de conter grande número de abusos cometidos em nome exclusivamente do lucro, mas não posso deixar de considerar a imensa incoerência que existe em certos discursos ecolóides, principalmente aqueles que partem de pessoas acostumadas a desfrutar dos confortos da modernidade. A propósito, será que os navios do Green Peace não são movidos a óleo diesel?
Hoje se fala em mundo globalizado e a maior parcela dessa globalização se deve aos avanços das telecomunicações, às interligações por computador, enfim a todo um aparato que só pode funcionar com o uso de energia elétrica. É viável, nesse momento, pensar num mundo sem eletricidade? Acontece que a maior parte dos países da Europa não possui potencial hidráulico para gerar energia a partir de hidrelétricas. A solução então é apelar para as termoelétricas que queimam diesel, ou gás natural, ou então para a energia nuclear. Estariam os europeus dispostos a retornar ao uso de lampiões ou lamparinas? (a propósito, lampiões queimam querosene).
Se você que está lendo nesse momento se considera um defensor da natureza, já deve ter pensado na possibilidade de passar a ingerir seu alimento cru, não é mesmo? Sim, porque cozinhar o alimento significa usar GLP que é subproduto do petróleo (ou será que eu estou enganado?) Claro sempre se pode recorrer ao bom e velho fogão de lenha (que delícia!), só que para se obter lenha é necessário derrubar árvores. Quantas árvores seriam necessárias para que todos os habitantes de São Paulo cozinhassem seu almoço? E os de Nova York? Sempre se pode cozinhar em fornos elétricos, mas aí, voltamos ao velho problema da eletricidade.
Volto a insistir: não estou aqui para fazer o papel de advogado do diabo; apenas gosto de trazer certas discussões para um patamar mais realista, mais próximo da verdade, a fim de combater certos modismos incômodos e chatos. Tem muita gente fazendo discurso ecológico e que já comprou o bacalhau (que está em extinção) para a semana santa.
Entendo que o assunto deve ser tratado com a devida seriedade e a primeira coisa que se deve entender é que muitos dos esforços que fazemos nessa área, como diminuir o tempo do banho, ou deixar o carro em casa para pegar transporte solidário, soam apenas simbólicos em face de grandes abusos que são cometidos todos os dias por pessoas por demais poderosas para serem alcançadas por nossos simples discursos.
Milhares de hectares de floresta na Amazônia são devastados todos os dias por latifundiários que pretendem aumentar suas pastagens ou sua área agricultável, a fim de abastecer mercados europeus e norte-americanos e encher os bolsos de dólares ou de euros, com os quais compram a complacência daqueles que realmente poderiam e deveriam fazer alguma coisa para impedir que assim fosse.
Os japoneses continuam matando baleias para robustecer sua economia já hipertrofiada e o mundo nada faz em relação a isso.
A verdade é que preservação ambiental é assunto que demanda políticas de estado bem elaboradas e bem executadas, exige fiscalização eficiente e punição exemplar para os verdadeiros infratores. No plano nacional deveria haver um esforço da parte de cada um de nós para exigir das autoridades que conduzissem políticas assim, ao invés de ficarmos policiando o vizinho para ver se ele está fazendo seleção de seu lixo.
No plano internacional, entendo que países como o Japão deveriam sofrer um embargo econômico semelhante ao que foi imposto a Cuba, mas quem seria suficientemente ousado para propor algo desse tipo? E pior: quem apoiaria?
Podem criticar à vontade esse artigo, mas gostaria de que alguém me apontasse uma solução plausível para as questões que levantei. O fato é que, de minha parte, estou cansado de discursos vazios, estou cansado de neuroses ecológicas, estou enojado de ver gente que não reflete, repetindo chavões que ouviu na televisão e votando nos mesmos vagabundos de sempre que nunca fizeram nada e nunca vão fazer, ou porque não se arriscam a ferir interesses poderosos, ou porque não estão nem aí para os problemas ambientais.
A propósito: eu não gosto de pescar. Jamais pescaria um bacalhau, mas enquanto não fazem embargos à Noruega, eu vou comer meu bacalhau na semana santa, porque ele já foi pescado mesmo e, se eu não comer, algum ecologista de plantão vai comer a minha parte.

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