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Frases Célebres

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Contra o Irã, tudo serve

Uma das piores coisas que existe em política é a hipocrisia enfeitada com chavões “politicamente corretos” e de grande apelo popular. É que a opinião pública tende a, em nome dos chavões, ignorar todo um contexto mais amplo para focar apenas em um fato isolado e fazer um julgamento de valor mais profundo a respeito daquele fato.
Isso é o que vem acontecendo em relação ao caso da iraniana - Sakineh Mohammadi Ashtiani – condenada à morte por apedrejamento, sob a acusação de haver cometido adultério.e que recentemente virou bandeira das organizações de direitos humanos (aquelas que defendem bandidos, assassinos, genocidas, e coisas desse tipo, mas nunca fizeram nada para auxiliar quem realmente precisa) espalhadas pelo mundo afora.
Até o nosso presidente, aquele especialista em gafes diplomáticas de todo tipo, já teve oportunidade de usar o episódio em campanha, oferecendo, de público, asilo à condenada, caso o governo iraniano concordasse em conceder; cometendo, dessa forma, mais uma de suas já famosas gafes, ao interferir em assunto interno do governo do Irã.
O mote de toda a comoção pública que o episódio vem causando reside no fato de uma mulher ser condenada por crime de adultério, o que parece, aos olhos do mundo ocidental, uma coisa disparatada e anacrônica. Eu até poderia concordar, mas a coisa não é bem assim e bem já disse o chanceler iraniano ao afirmar que o presidente Lula não conhece os detalhes envolvidos na história
Detalhes à parte, cabe uma breve consideração sobre a postura de Lula e da maioria dos brasileiros a respeito do assunto: ora, o Irã é um país de sessenta e seis milhões de habitantes, dos quais oitenta e cinco por cento são muçulmanos xiitas. Todo mundo sabe que lá a religião governa o país, que o estado é teocrático e que a legislação tem toda a sua base no Corão. Isso é uma escolha deles como povo e o direito a essa escolha está intimamente ligado a outro conceito de grande apelo popular: o direito à autodeterminação dos povos.
Antes que alguém ataque a religião islâmica – o que já é moda há algum tempo – vale dizer que é uma doutrina religiosa tão boa como qualquer outra e que provavelmente guarde algumas imperfeições como todas as demais. Qualquer brasileiro sensato deve procurar se lembrar de que o Brasil é um país de maioria católica, que o Catolicismo é uma religião tipicamente ocidental e que, se dependesse da Igreja de Roma, o adultério ainda seria considerado crime em nossa legislação (mesmo Jesus tendo absolvido a adúltera) e mais que isso, o uso de anticoncepcionais seria proibido, nenhuma forma de aborto seria permitida por lei, o divórcio não existiria, não haveria pesquisas com células-tronco; isso para citar apenas alguns pontos.
Mas o problema do Irã não é esse. O fato é que, já há algum tempo, os Estados Unidos iniciaram uma campanha de persuasão – a exemplo da que houve contra o Iraque – visando a convencer o mundo de que o Irã é hoje a maior ameaça à preservação da paz mundial e ao equilíbrio do mundo. Tudo isso, certamente, com o objetivo de atacarem o Irã e se apoderarem das reservas petrolíferas daquele país, assim como já se apoderaram das do Iraque. A campanha pegou e presentemente tudo que acontece de ruim no mundo tem a ver com o Irã.
Nesse ponto, a fim de que tudo fique muito bem esclarecido, vale acrescentar que, pelo que se sabe do caso, Ashtiani não é acusada somente de adultério, mas também de haver participado no assassinato do próprio marido. Isso faz dela, além de adúltera, também homicida, mas esse detalhe vem sendo sorrateiramente ocultado por todos aqueles (incluindo a imprensa) que se propõem a falar do assunto.
Não vou entrar no mérito da questão do adultério, porque esse merecerá um artigo autônomo. Quero acentuar aqui que os costumes e a legislação de um país geralmente estão em consonância com o pensamento médio da sociedade. Se, para nós, brasileiros, práticas como o apedrejamento de adúlteras parecem bizarras e anacrônicas, para eles a nossa permissividade soa como algo insano e diabólico, mas não temos tido notícias de interferências do governo ou do povo iraniano no nosso jeito de viver.
Considero urgente que aprendamos a valorar os fatos de um modo mais sensato e menos afetado pela propaganda ideológica que nos bombardeia todos os dias. Sinto que questões como o adultério, por exemplo precisavam ser mais discutidas e refletidas pela nossa sociedade, assim como a pena de morte (não aplicada ao adultério, é claro) cujas considerações tecidas a respeito sempre se situaram na faixa dos chavões, da emotividade e da religiosidade.
Mais do que isso, sinto que precisamos buscar nos interarmos dos fatos de um modo mais completo, a fim de evitarmos a emissão de juízos de valor sobre coisas que desconhecemos, ou que pelo menos não conhecemos de forma mais profunda. É lamentável ver o Presidente da República assumindo atitudes passionais, panfletárias e desprovidas de senso crítico.
Antes que me perguntem qual minha posição quanto ao casa da Ashtiani, vou logo dizendo: não sei. Não conheço a questão em profundidade. Com base nos meus princípios e em meu referencial civilizacional eu não seria favorável a uma execução por causa de um adultério simplesmente, embora ache que o adultério em si deva realmente ser punido de alguma forma. No mais, como se trata de costumes de um povo, entendo que é desejável que os iranianos tenham liberdade de agir como iranianos e que nós tenhamos liberdade de continuar a agir e pensar como brasileiros.
Agora, existe uma coisa que realmente me incomoda profundamente em tudo isso: é que eu vejo tanta celeuma e tanta condenação ao Irã por causa de uma única execução e não vejo nenhuma censura ao genocídio praticado por Israel na Faixa de Gaza.

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